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19 de Abril de 2024

Imposto de Renda sobre precatório alimentar

há 11 anos

Por Eduardo Diamantino

É sabido que a aquisição de precatórios para enfrentamento de passivos tributários é, já há algum tempo, medida constantemente utilizada pelos contribuintes.

Ainda sob a égide da Emenda Constitucional (EC) nº 30, e artigo 78 do ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), ou seja, muito antes da promulgação da EC nº 62 criou-se um mercado de negociação de tais créditos, pois os governos federal, estaduais e municipais só tinham suas dívidas aumentadas em face do não pagamento do precatório.

Essa comercialização de crédito tornou-se cada vez mais comum, já que trazia "benefícios" tanto para o titular do direito quanto para o devedor dos cofres públicos. Ao primeiro porque, ainda que com deságio, consegue receber valores que, a depender do pagamento pelo Estado, talvez não estivesse vivo para perceber o dinheiro. E ao segundo porque teria a possibilidade de quitar sua dívida com "desconto" perante o Fisco.

A operação comumente realizada para negociação dos créditos consiste na transação por meio de escritura pública, registrada em cartório para que seja possível a habilitação dos valores nos autos do processo judicial (execução contra a Fazenda Pública).

Convencionou-se que sobre os valores negociados não haveria a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF). Ou seja, a negociação se daria tão somente em relação ao valor líquido efetivo, ficando reservado em nome do credor originário, a parte que sofreria a incidência do IRRF.

Tal prática não nos parece a mais correta. A incidência do Imposto de Renda sobre o precatório alimentar ocorre quando do efetivo recebimento dos valores, pouco importando se esse foi diretamente da entidade devedora ou por meio da comercialização de um direito com terceiros. É o mesmo que dizer que na pessoa física vale o regime de caixa. Se o dinheiro entrou deve ser imediatamente declarado e oferecido à tributação do IR, nos termos do artigo 38 do Regulamento do Imposto de Renda (RIR).

O IR sobre precatório alimentar ocorre no efetivo recebimento dos valores

Dessa maneira, aqueles que cedem créditos e não os declaram estão na verdade deixando de pagar o IR na data devida. A verdade é que igualmente incorreta é a esperada retenção praticada pelos entes pagadores conforme determinação da Receita Federal, tratando esses valores como se pertencessem ao antigo proprietário. Agindo dessa maneira, desconhecem uma cessão legítima e legal e passam a exigir tributo sobre um fato que inexiste juridicamente. Explicando melhor: o fator impossível da retenção na fonte, discutido no artigo 38 do RIR não existe, visto que houve recebimento em um momento anterior, pelo credor que já se submeteu ao recebimento de direitos e lançou o valor do carnê leão.

A razão disto é que o precatório deixa de ser alimentar quando é comercializado pelo credor originário. Essa questão foi objeto de grande polêmica. Inicialmente os próprios devedores defendiam a tese de que esses precatórios jamais perderiam esse caráter e, consequentemente, não se encaixariam no parágrafo II do artigo 78 do ADCT que permitia a referida compensação. O tema chegou ao Supremo Tribunal Federal pelo Recurso Especial nº 566349, de relatoria da ministra Cármen Lúcia, que como tantos outros que afetam a matéria não foi julgado ainda.

Entretanto, afirmar que o precatório perde o caráter alimentar quando cedido é possível através da Emenda Constitucional 62, que encartou no artigo 100 da Constituição Federal. O inciso dispõe que "os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas federal, estaduais, distrital e municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim" (Art. 100). Em seu parágrafo 1º, o referido artigo define que "os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no parágrafo 2º deste artigo". E em seu parágrafo 13 está expresso que "o credor poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor, não se aplicando ao cessionário o disposto nos parágrafos 2º e 3º".

Assim, a partir da promulgação da emenda, não há razão para acreditar que o precatório alimentar mantém tal caráter quando cedido, sendo igualmente sem sentido deixar de declará-lo quando do seu recebimento e submeter-se a negociações com terceiros que considerem uma retenção na fonte do IR que, afinal, jamais deverá ocorrer.

Acertar a incidência do IR nesse caso se faz necessário para não termos mais um equívoco, na desastrada política de pagamentos de dívida pública.

Portanto, temos que precatório alimentar cedido a terceiros não deve sofrer retenção de Imposto de Renda na Fonte, visto que o fato econômico a ser tributado não é o previsto inicialmente.

Eduardo Diamantino é sócio do escritório Diamantino Advogados Associados em São Paulo e vice-presidente da Academia Brasileira de Direito Tributário (ABDT)

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